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Educação: para quem? (Parte I)



 

Toda pessoa que já pisou em uma sala de aula em algum momento, de forma mais ou menos consciente, precisou refletir sobre uma questão fundamental: educação, para quem?

 

Esta pergunta se revela especialmente importante porque em muitos sentidos nos faz pensar sobre os objetivos que almejamos alcançar. Vamos juntos pensar sobre isso?

 

Seja sincero, quando você, professor, professora, ou especialista que entra em algum lugar para ensinar, sempre entra na sala de aula pensando que você detém alguma informação, ideia, raciocínio ou conhecimento que pode ser útil para os outros e por isso tais pessoas deveriam prestar atenção em você.

 

Quais seriam essas informações? Não poderiam ser encontradas de outras formas? Por que dependem de você para chegar ao público? Que ideia é essa? Elas não poderiam ser desenvolvidas sem você? Que raciocínios são estes? Eles não poderiam ser alcançados sem sua instrução? Que conhecimentos são esses? Eles não poderiam ser construídos sem a sua docência?

 

De algum modo sabemos, nós que ensinamos algo, que o nosso ofício é especial, não porque é uma informação que só nós temos acesso, não porque nós temos ideias que são exclusivamente nossas e precisam chegar aos outros. Não porque possuímos modos de raciocínios tão sofisticados que só nós podemos ensinar e, definitivamente, não é porque possuímos conhecimentos que só podem ser construídos com o nosso auxílio.

 

Sendo assim, precisamos, todos nós que pretendemos ou exercemos a docência, ter com alguma objetividade diante de nossos olhos, para quem estamos falando. Se estamos apresentando uma informação, é porque de algum modo as pessoas que nos dirigimos não tiveram acesso a tal informação. Por que não tiveram acesso? Agora esta se torna a pergunta mais importante para montar o nosso discurso, afinal, somente assim poderemos planejar a forma adequada de apresentar tal informação e a sua utilidade, serventia ou pertinência para quem dirigimos o nosso empenho.

 

Caso estejamos apresentando uma ideia, precisamos ter muita clareza do porquê as pessoas que estamos apresentando não pensaram de tal forma. Elas puderam fazer parte da tradição desta área que dominamos? Ou será, que elas estão tendo acesso a tradição de uma área de conhecimento através de nossas aulas? Ou ainda, será que os universos culturais destas pessoas estão em relação direta com o objeto que estamos apresentando? E se não estiverem? Por que não estão?

 

Ainda temos o caso da condição de apresentarmos raciocínios e conhecimentos. O que torna ou tornou a nossa condição especial para apresentar um raciocínio como válido ou um conhecimento como verdadeiro? Ou dito de outra forma, o que legitíma que nós nos posicionemos diante de um contingente de pessoas para ensinar algo?

 

Sabemos que neste texto estamos levantando problemas, no entanto, somente perguntando a cada um de nós que se coloca na posição de “ensinantes” podemos compreender para quem estamos lecionando. Somente compreendendo para quem falamos, como falamos e porque falamos, é que poderemos desenvolver um discurso adequado para atingir os nossos objetivos.

 

É óbvio que somente esta esfera de problematização não é o bastante para nos formar sobre a pergunta: para quem ensinamos? A problematização é um primeiro passo para que possamos construir maior consciência, maior deliberação e maior nível epistêmico para enfrentar esta pergunta – que parece muito simples, mas diz muito sobre nós, nossa sociedade e sobre as imagens que fazemos de nós mesmos e dos outros que se relacionam conosco.

 

Em breve traremos mais reflexões.

Atenciosamente.

Prof. Ricardo de Jesus Lopes

 

Observação: Gostou do texto? Ajude-nos compartilhando, comentando ou criticando!


Comentários

  1. Adorei....e muito importante um educador com seus ensinamentos.....sem ele as pessoas não poderiam aprender.....Parabéns
    Célia........te admiro

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  2. Que alegria percorrer essa reflexão contigo Ricardo.
    Frequentemente no exercício da docência me deparava com a questão do público que pretendia atingir. E tinha a angústia de tentar fazer algo significativo para o grupo que propunha minha aula. Essa inquietação é sem dúvida o combustível do profissional comprometido, tentar fazer do seu ensino algo especial, personalizado, que responda a necessidade e realidade do aluno e respeite nossa formação. Bom quadripé que fermenta a reflexão.
    Obrigado pela provação.

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  3. Salve, Ricardo !! Ótimas questões ! O texto apontar para a importância ainda do professor para problematização do conhecimento científico. Outro ponto muito relevante e o olhar freiriano, o que ensino e para quem ? Parabéns, camarada !!
    Diei !!

    ResponderExcluir

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