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Cotidiano Mecânico: como trabalhamos?



Saudações fraternas, é um prazer inenarrável ter sua companhia neste texto.


É comum e mecânico. Acordar todos os dias com o despertador, realizar os cuidados higiênicos, tomar o café da manhã, sair para o trabalho, iniciar as suas tarefas laborais, fazer uma pequena pausa para um café, um chá ou uma água, voltar ao trabalho, no horário pré-definido sair para o almoço, tentar descansar alguns minutos antes de retornar ao ofício, reiniciar os afazeres do dia, no meio da tarde fazer mais uma pequena pausa, concluir as expectativas do dia ou reprogramar para continuidade no amanhã, arrumar seus materiais para encerrar seu dia profissional, em seguida rumar para casa, em casa o ambiente exige cuidados para que fiquem garantidos minimamente os seus confortos, talvez dê tempo de você encontrar algum amigo (a/e), você precisa se alimentar e finalmente se preparar para descansar, afinal, o próximo dia demanda tanta energia quanto este. Existem pessoas que vivem de modo mecânico... é uma escolha? Quem pode viver assim? Quem realmente quer viver assim?


Não precisamos de grande esforço de imaginação ou conhecimento sociológico para entender que o modo de vida mecânico narrado acima é uma condição bastante própria daqueles que dedicam ao ofício, ou aquilo que chamamos  normalmente de trabalho, para garantir a sua existência. Mas, igualmente sem requisitos mínimos, conseguimos consolidar a convicção que pessoas que possuem trabalhos mais vulneráveis possuem maior dificuldade para cumprir os seus objetivos diários e precisam sempre que necessário ultrapassar os horários, abrir mão de intervalos, ou de um descanso, ou até mesmo de se alimentar com qualidade, para tentar concluir seu objetivo diário, e mesmo assim, com todos os sacrifícios possíveis ainda existirá quem não consegue chegar até o final do dia tendo o resultado mínimo esperado para a sua vivência básica.


Quem são as pessoas que precisam dedicar a vida para garantir os meios de realização de sua própria existência? Estas pessoas são força produtiva de sua própria condição, sendo assim, elas acessam integralmente os frutos de seu trabalho? Todas as pessoas vivem desta maneira? As pessoas em condições mais vulneráveis que não conseguem produzir o necessário para si, vivem como? Por que existem pessoas que trabalham de domingo a domingo e outras tem jornadas menores e outros tantos da sociedade são inativos? O que é este modelo de vida mecânica que assumimos para nós? Os regulares têm ganhos regulares, os vulneráveis tem ganhos vulneráveis, os inativos tem sua sobrevivência mantida pelos ativos?


Em nosso cotidiano não possuímos muito tempo para pensar, refletir, construir pensamento consistente e crítico sobre estes temas, por isso, gostaria de perguntar a ti: tais questões são relevantes para a nossa vida? Ou seja, os modos pelos quais organizamos os tempos de nossa existência, os nossos esforços e os meios como dividimos com outros os resultados de nosso empenho são temas relevantes para que todas as pessoas tenham consciência e convicções?


Nestes últimos tempos tem aumentado a minha convicção de que o modelo de vida mecânico, um modelo que não tem espaço para o ócio, para o descanso verdadeiro, ou para um lazer qualificado, produz uma incapacidade generalizada de entender e escolher os modos de vida de cada um de nós. “Nossa, mas isso não é nenhuma novidade”, você leitor aguçado me dirá. Saiba que você tem toda razão, quanto tempo sabemos deste problema que enfrentamos? Mas, quando proponho este texto para tocar no assunto, gostaria de provocar você a me responder: mesmo não sendo um assunto novo, quais são as respostas benéficas para a vida que estamos alcançando até este momento de nossa história?


Quando lemos reportagens de países que estão propondo reformas trabalhistas que visam a diminuição das horas trabalhadas e dos tempos destinados para o cuidado de si, para a fruição da cultura, ou para se dedicar a família, pensamos: “aqui no Brasil ainda estamos tão longe disso”. Ainda, embora não seja absoluto, mas circula como pensamento geral, quando se levanta problematizações sobre o funcionamento das organizações econômicas e da divisão social do trabalho a população brasileira entende como um “tema de esquerda”, ou que o modo pelo qual estamos enfrentando esta dinâmica social fosse “natural” (no sentido de ser a única possível). Este é um assunto de esquerda ou diz respeito a todos que trabalham para criar as condições de sua existência?


Para não me alongar neste texto, deixando tempo para que você pense sobre a questão, não está na hora de realizar um grande empenho coletivo para pensar, refletir e transformar as nossas condições de trabalho? Isto que está sendo chamado de “tema da esquerda” não está “demonizando” para inviabilizar um pensamento amplo sobre o tema? Qual é o problema do modo de pensar do que é chamado de “esquerda” no Brasil? Isto que está sendo chamado de única via possível é verdadeiramente a única via? Em suma, nesta breve reflexão gostaria de lhe perguntar, de forma final, como você quer viver e trabalhar?


Precisamos nos dedicar neste tema!


[Gostou deste texto ou tem alguma crítica? Comente, compartilhe e ajude  este trabalho autônomo e feito com muito carinho a se desenvolver. Juntos podemos chegar mais longe!]

Atenciosamente.

Professor Ricardo de Jesus Lopes

Comentários

  1. Quero trabalhar menos e com aumento de salário. Quero tempo para meu ócio criativo. Quero ver menos desigualdade e mais humanidade.

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    1. Somos 2. Mas, precisamos ir para a luta política, porque, caso contrário, o rumo das coisas não parecem tender ao nosso desejo. Obrigado por sua leitura.

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