Saudações fraternas, é um prazer inenarrável ter sua companhia neste texto.
É impressionante como existem palavras que conseguem ganhar notoriedade dada a sua diversidade semântica, no entanto, existem algumas poucas palavras que além de sua multiplicidade semântica traz consigo uma variedade etimológica, epistêmica, ética, política, estética etc., uma delas é “filosofia”.
Quem não adoraria que todas as perguntas que podemos levantar tivesse respostas simples e objetivas? Não é o caso da situação que trabalharemos aqui e, sem dúvida, se as respostas do mundo, da existência, do pensamento e dos humanos fossem objetivas nós ao longo dos milhares de anos da existência de nossa espécie teríamos dado passos maiores do que os que nos trouxeram até aqui.
Não é novidade, nem original, o tema proposto nos parágrafos que seguirão, mas, dadas as condições de nossa formação é preciso estimular que a tradição filosófica seja valorizada, conhecida, criticada, trabalhada, em suma, reconhecida dentro da dinâmica do conhecimento proporcionado pela inteligência de nosso povo.
Muitos tiveram a audácia de tentar definir o que é a filosofia e o filosofar, tendo por objetivo esclarecer e revelar a importância do pensamento filosófico, mas, precisamos reconhecer que quanto mais se tentou explicar maior foi a diversidade de assuntos, sentidos, pensamentos, reflexões que precisaram ser aglutinadas no termo “filosofia”.
Para tentar acrescentar aos grandes que já se desafiaram neste desafio, proporemos um trabalho que visa juntar as tentativas mais notórias e as mais abrangentes para que o público que inicia os estudos em sentido formal ou informal possa se amparar. Sobre o ombro dos grandes procuraremos, enquanto pequenos, nos apoiar para alcançar com os olhos de nosso espírito um horizonte mais longínquo e fecundo.
Para iniciar a nossa investigação gostaria de destacar uma consideração bastante fecunda proposta pelo Professor Sílvio Gallo (1963-):
“A filosofia já foi definida de várias maneiras. A palavra, de origem grega, é composta de phílos, que designa o ‘amigo, amante’; e sophía, que significa ‘sabedoria’. O significado de filosofia, portanto, é amor ou amizade pela sabedoria. Se a filosofia é um amor pela sabedoria, isso quer dizer que ela não é a própria sabedoria, e sim uma relação com o saber e que implica um movimento de construção e de busca da sabedoria (GALLO, 2016, p.12)”.
O Professor Gallo (2016) ao mesmo tempo que apresenta o sentido etimológico do termo filosofia, derivação semântica aglutinada de dois termos gregos antigos que consolidam a ideia de “amor pela sabedoria”, traz o movimento epistemológico que o termo procurou abarcar desde seu surgimento formal na língua, ou seja, o termo foi cunhado com a intenção de revelar que a filosofia não é a posse da sabedoria ou a própria sabedoria, mas, na verdade, é uma relação que ocorre quando um sujeito busca a sabedoria, ou, ainda, é um movimento de construção dos saberes.
“Amar a sabedoria”, talvez assim, neste sentido de ação, podemos compreender ao que se dedica aquele que se dedica ao filosofar. Assim trazemos a dimensão de um agir, de um esforço, de um trabalho que visa alcançar um determinado objetivo e, cá entre nós, não é qualquer objetivo, é a sabedoria. E, sabedoria, pode ser entendida tanto quanto um saber extenso, qualificado e profundo, como também pode ser entendido como a capacidade de utilizar os saberes para o bem, para o bem viver e para o bem coletivo.
Desde a origem do termo, a palavra filosofia já quis demonstrar esta sua capacidade especial, abrangente e profunda, e uma forma de ação que visava se diferenciar das demais formas de conhecimento. Segundo a Professora Marilena Chaui (1941-):
“Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos (que viveu no século V antes de Cristo) a invenção da palavra filosofia. Pitágoras teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos (CHAUI, 2000, p. 19)”.
Nesta especialidade que o termo filosofia já buscava mesmo em sua origem, a ideia central era diferenciar dos demais discursos vigentes que os humanos utilizavam para explicar o funcionamento do universo, ou seja, podemos dizer que é uma saída da humanidade das explicações cosmogônicas (universo ordenado pelos astros, deuses ou forças superiores) para uma explicação cosmológica (universo ordenado pela razão).
Isto não quer dizer que os astros, deuses, ou forças superiores não existam, mas, como o próprio Pitágoras de Samos teria dito, esta ordem do conhecimento não pode ser acessível para nós mortais, humanos, terrenos, racionais. Para nós, seres limitados de tantas formas, talvez jamais tenha sido possível e jamais será possível alcançar a plena sabedoria, mas, pela capacidade pensativa, lógica, racional, podemos amá-la e procurá-la.
Já que não podemos alcançar, ou é muito difícil alcançar a sabedoria, o que é esta procura? Do que estamos falando quando propomos filosofar? A própria professor Marilena Chaui resgata a forma como Pitágoras de Samos teria explicado, diz:
“Dizia Pitágoras que três tipos de pessoas compareciam aos jogos olímpicos (a festa mais importante da Grécia): as que iam para comerciar durante os jogos, ali estando apenas para servir aos seus próprios interesses e sem preocupação com as disputas e os torneios; as que iam para competir, isto é, os atletas e artistas (pois, durante os jogos também havia competições artísticas: dança, poesia, música, teatro); e as que iam para contemplar os jogos e torneios, para avaliar o desempenho e julgar o valor dos que ali se apresentavam. Esse terceiro tipo de pessoa, dizia Pitágoras, é como o filósofo (CHAUI, 2000, p. 19)”.
O exemplo pitagórico destaca a qualidade das experiências possíveis aos humanos, existem aqueles cuja finalidade é tentar manipular a ordem da realidade para produzir benefícios individuais, tal como riqueza ou vantagens, ou aqueles que visam demonstrar maior compreensão sobre o melhor manusear das realidades, ou os que diante da realidade procuram reconhecê-la, contemplá-la e avaliar/julgar os modos pelos quais funciona. Ou seja, existem os que se dedicam exclusivamente de forma prática-funcional com a realidade e existe o filósofo que se coloca diante da realidade para contemplar a verdade, procurar sua razão de funcionamento e entender como estar diante dela.
Os que souberem com maior influência determinar as realidades para seu benefício próprio agregarão riquezas, enquanto os que não forem hábeis nisto, menor riqueza, os que souberem manipular de modo mais a eficaz a realidade para ser o melhor em algo serão reconhecidos como “campeões”, enquanto os menos hábeis serão os derrotados. Por fim, existem os que se dedicam a comtemplar e compreender a existência, estes serão os filósofos, os que não forem hábeis filósofos recaem nas duas formas anteriores de existência.
Portanto, segundo este sentido pitagórico, o papel do filósofo não é buscar riquezas ou consagração, mas sim colocar-se diante do universo de acordo com sua posição, compreendendo sua limitação, contemplando a verdade e buscando as razões pelas quais ela opera.
Evidentemente, esta explicação proposta ainda na antiguidade traz em si marcas profundas de sua época e a filosofia, tal como a concebemos hoje, transformou-se determinantemente conforme cada pensador e pensadora estabeleceu sentidos tradicionais, conservações e transformações, por isso, não podemos limitar o pensamento filosófico simples como busca pela sabedoria e não podemos limitar a posição do filosofar como exclusivamente contemplatória. Em suma, não podemos nos prender exclusivamente na etimologia para compreender o que é a filosofia.
A filosofia nos dá a possibilidade de questionarmos tudo. Nos traz sabedoria para sermos um ser humano completo.
ResponderExcluirObrigado por sua leitura e por seu comentário. Espero que continue acompanhando os textos daqui. Atenciosamente.
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